Como de costume, no balanço de fim de ano, percebi que em 2009 vi, ouvi, assisti, escrevi e li menos do que seria desejável. Perdão, Mnemósine, por dar pouca atenção a tuas filhas! Algumas vezes por falta de dinheiro, outras por falta de tempo. Outras vezes, por falta de vergonha na cara, mesmo. A pouca paciência (ou a preguiça) me fez evitar o trânsito paulistano na maioria das noites. Morando no Butantã, na rive gauche do rio Pinheiros, atravessar a ponte é, cada vez mais, um suplício.
Televisão, não assisto. Um ou outro noticiário, de vez em quando. Adoro cinema, mas pegar um filme na locadora e assisti-lo na telinha é um ato redutor, em todos os sentidos. Conto nos dedos das mãos as vezes em cometi tal gesto, na última década. E vai sobrar dedo…
Teatro é outro fracasso. Embora tenha realizado projetos ligados a teatro em 2009, o que me obrigou – prazerosamente – a assistir alguns ensaios e apresentações, fui um péssimo exemplo para o público. Cheguei a tentar ver A Alma Boa de Tetsuan e perdi para o transito. Frustração total. Perdão, Tália, perdão, Melpômene!
Dança, então, melhor não tocar no assunto. Uma apresentação do Stagium, uma pequena entrevista com a Marika. E olha que tem gente da família que leva dança a sério, e entende do riscado. Perdão, Terpsícore!
Não vi mais que uma dezena de apresentações de música popular, em 2009. Metade delas, na casa de amigos. Concertos sinfônicos? Um, para ser exato. E um concerto de claviorgano. Jazz? Zero. MPB? Uma cifra constrangedora, principalmente para quem se mete a escrever sobre o tema. Mil perdões, Euterpe! Desculpe, Polímnia!
Artes plásticas? Fraco, em Sampa. Uma ou outra instalação, os franceses que fizeram a Virada Cultural no Jardim da Luz, o Matisse na Pinacoteca, e as pichações que vejo nos muros da cidade. Bati um papo com o Kobra. Só escapei da lama por ter visitado alguns museus legais. Pensando bem, até que fiquei bem na fita, nesta área.
Ouvi muito discurso, gravei muita falação, escutei muito blábláblá. Não reclame, Calíope, você está bem servida!
Sobrou a literatura. A mais humilde e mais profunda das artes. Depois de enfrentar o monumento de Canetti, no começo do ano, a energia despendida me fez passar uns meses de reflexão. Fui me recuperar lá pelo meio do ano, mas devagarinho. Gostei muito da Elza do Sérgio Rodrigues, bem menos do Leite Derramado do Chico. Pouco sobrou para a poesia, que felizmente hoje se esparrama por meios não impressos. Obrigado, Dalila! Obrigado, Ana Peluso e Neuza Pinheiro. Perdão por não ter sido mais assíduo, Erato!
E, em dezembro, percebi que meu déficit era assustador. De lá pra cá, li três romances, uma novela e alguns contos. Apreciei muito a simpática saga do elefante de Saramago, muito menos pretensioso que o Caim, e provavelmente melhor. Me surpreendi com a estréia ficcional do poeta Fábio Brazil, que me trouxe um monte de lembranças de um Bixiga que hoje não existe mais. Belo romance policial paulistano, que oxigena a tradição de Alcântara Machado e Marcos Rey.
Descobri tardiamente o Leão Rampante, do Rodrigo Lacerda. Um delicioso relato, onde a forma é tudo. E esta semana me diverti com alguns ensaios do Suassuna, cheios de verve (e alguns preconceitos). Cabra bom!
Prometo, em 2010, ser um bom menino, mais assíduo com meus deveres e oferendas. Perdão, Clio!
PS, em 10/01: Não posso deixar de citar o livro mais emocionante que li em 2010: Estação Paraíso, de Alípio Freire. Aurora revelada através da poesia.